quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Dezoito Andares

O meritíssimo senhor
Doutor desembargador
Estacionou seu carro na sarjeta
Depois deu uma gorjeta
A um elemento sem camiseta
Portando uma flanela de trapo
Subiu impassível
Os dezoito andares
de mármore, granito e porcelanato
Separando seu gabinete
Do mundo sem ar-condicionado
Adentrou o recinto
Com o peito estufado
Deu bom dia aos serviçais
Como de costume e praxe
E sentou-se em seu trono
De couro preto estofado
Respirou fundo
Batucou a caneta na bancada
E começou a folhear
Um dos muitos processos
Jazendo modorrentos
Por todos os cantos da sala
Era mais só mais um alguém
Mais um igual a muitos outros
Igual a todos os outros muitos
Tijolos de papéis e dores
Que amontoados fariam uma escada
Capaz de descer o desembargador
Do alto de seus dezoito andares
de notório saber jurídico
Títulos, comendas e honras
De volta ao planeta térreo
Onde dormia seu carro preto
Ninado por um pobre preto
Portando uma flanela de trapo.

Francisco P Nieto

Sem comentários:

Enviar um comentário